ARTIGO ACÍLIO LARA RESENDE – “ANTES SE ROUBAVA PARA FAZER POLÍTICA, HOJE SE FAZ POLÍTICA PARA ROUBAR”
O que me faz voltar à operação Lava Jato é uma das frases – que usei para dar título a este artigo – do jornalista italiano Gianni Barbacetto, entrevistado no programa “Roda Viva”. Gianni trabalhou em jornal, rádio, televisão e cinema. Como repórter, cobriu a operação “Mãos Limpas”, que comprovou pagamentos de propinas a políticos com vistas à conquista de licitações na construção civil. Ela também inspirou a operação Lava Jato. Em companhia dos repórteres Marco Travaglio e Peter Gómez, que, na mesma época, foram repórteres do jornal “il Fatto Quotidiano”, publicou o livro “Operação Mãos Limpas”. Sua entrevista à TV Cultura, sob o comando do jornalista Augusto Nunes, merece ser vista. Diria até que ela é imperdível. Está disponível no canal do youtube.
Não sei se a frase dita por Gianni Barbacetto reflete, exatamente, o que acontece em nosso país. Todavia, de muitos anos para cá, ficou evidente que a política por estas bandas se transformou em eficiente meio para se fazer negócio. Esqueceu-se de que “a arte de governar, segundo Thomaz Jefferson, consiste, exclusivamente, na arte de ser honesto”. São várias as causas dessa repulsiva distorção. Nosso sistema eleitoral é uma delas. Está na cabeceira. No início, usava-se, à vontade, o caixa dois para se eleger. E ninguém contestava, apesar do desrespeito à essência do regime democrático. Só se elegia o candidato que dispunha de mais dinheiro. E isso ainda poderá ocorrer em 2018.
Era assim o paradigma adotado por qualquer político. As eleições foram se encarecendo ao longo do tempo e o caixa dois, que antes não era crime, já não bastava. Era necessário ir mais além. Afinal, na política, tudo era válido. Grassou, então, a propina, custeada pelo dinheiro público. Vários partidos políticos, obviamente acompanhados pelos eleitos, aparelharam empresas públicas e, através dos cupinchas que nomeavam para tocar sua gestão, desviaram bilhões de reais. Parte ia para os partidos (ou para seus donos) e para candidatos da sua preferência; parte ia para o bolso dos cupinchas, que se enriqueciam criminosamente. Os depoimentos de executivos da Petrobras, que fizeram delação premiada, jamais serão apagados da nossa memória.
O que ocorre aqui ocorre em outros países. Portugal, por exemplo, tem sua operação Lava Jato, não tão extensa, nem tão profunda, pelos valores que ela envolve. Chama-se “Operação Marquês”. Há poucos dias, o Ministério Público denunciou o ex-presidente José Sócrates (2005/2011). A acusação contra ele – a de ter transformado seu gabinete num balcão de negócios – tem mais de 4.000 páginas. Pretende-se recuperar por lá, pelo menos, 58 milhões de euros. A operação portuguesa, segundo o colunista Mathias de Alencastro, da “Folha de S. Paulo”, “chega num momento em que Portugal atravessa sua melhor fase desde o começo do século: o crescimento do PIB atinge números históricos, e a classe política reconquistou uma imagem positiva. E, talvez ainda mais importante, a credibilidade das instituições, que se destacaram pela sua discrição, permanece intacta”.
A operação de Portugal, que transcorre com discrição, lembra o que disse o advogado Técio Lins e Silva, no artigo “Advocacia em tempo de cólera” (“O Globo”, 29/10/2017): “É inaceitável a alegação, falsa, de que o necessário combate à criminalidade, especialmente a que assalta os cofres públicos, exige a flexibilização de direitos”.
E é só!, diria o saudoso Ariosvaldo de Campos Pires.
Acílio Lara Resende, jornalista
Foto: Jornal O Tempo