Segurança pública avança em Senado renovado; veja os principais temas votados pela atual legislatura
Um Congresso renovado — e com a presença de muitos representantes de policiais e de segmentos militares — foi palco de mudanças importantes na área da segurança pública. Além da aprovação em “tempo recorde” do pacote anticrime do governo, os senadores deram outras contribuições para tentar reduzir os índices de criminalidade e dar uma resposta à sociedade, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC 75/2019), que torna imprescritíveis e inafiançáveis os crimes de feminicídio e estupro, e a lei que permite ao proprietário ou gerente de fazenda andar armado em toda a área da propriedade.
A preocupação da atual composição do Senado com a violência, a segurança pública e o combate à impunidade, que estão entre os temas mais valorizados pelos brasileiros nas eleições do ano passado, ficou evidente desde o início do ano legislativo, em fevereiro. Só no primeiro mês de trabalho, os senadores apresentaram mais de 30 propostas relacionadas a essas áreas.
Tiveram destaque em 2019 a discussão em torno da posse e do porte de armas (bandeira do presidente da república, Jair Bolsonaro, durante a campanha eleitoral de 2018) e a aprovação da Medida Provisória 885/2019, que visa facilitar e agilizar o repasse de recursos decorrentes da venda de bens apreendidos do tráfico de drogas. Outra questão que recebeu a atenção dos parlamentares foi a criação das polícias penais.
Pacote anticrime
Entregue no início do ano ao Congresso pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, o pacote anticrime foi aprovado pelo Senado na noite de 11 de dezembro. O pacote, que tramitou na Casa sob a forma do projeto de lei (PL) 6.341/2019, modifica a legislação penal e processual penal para torná-la mais rigorosa.
A tramitação no Senado foi rápida: no mesmo dia em que chegou à Casa, em 10 de dezembro, o projeto foi aprovado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado (CCJ). Pouco mais de 24 horas depois, o pacote recebeu o aval do Plenário. E, em 24 de dezembro, o texto foi sancionado pelo presidente da República.
A rapidez da tramitação no Senado foi destacada pela presidente da CCJ, senadora Simone Tebet (MDB-MS), como sinal do comprometimento de todos os parlamentares com o tema.
— Se hoje conseguimos entregar [o projeto] à sociedade em tempo recorde, é graças ao esforço de todos os líderes para costurar um acordo unânime. Encerramos o ano com chave de ouro. Esse pacote vai ao encontro dos anseios da sociedade — disse Simone na ocasião da votação.
O texto final é resultado do esforço de um grupo de trabalho da Câmara dos Deputados, que fez várias alterações na versão original. No Senado, além do acordo firmado pelos líderes partidários para a aprovação da matéria, a rapidez também tem outra causa: os senadores acompanharam de perto as discussões na Câmara, desde o momento em que as propostas foram apresentadas. Em março, inclusive, textos idênticos foram apresentados no Senado, assinados pela senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) e por outros senadores, para iniciar a tramitação e agilizar a discussão na Casa. Um deles, o Projeto de Lei 1.865/2019, chegou a ser aprovado na CCJ em julho, sendo enviado em seguida à Câmara.
O relator do pacote anticrime foi o senador Marcos do Val (Podemos-ES). Ele negou que o texto tenha sido “desidratado” durante sua passagem pelo Congresso. E ressaltou que a maior parte das medidas fundamentais foi preservada.
— Não é verdade que virou um ‘pacotinho’. Algumas propostas ficaram até mais rígidas. Conseguimos avançar bastante — disse o senador capixaba, acrescentando que “a segurança pública passou a ser a principal preocupação do cidadão”.
Com a intenção de recuperar pontos do pacote que foram alterados na versão aprovada pela Câmara e pelo Senado, o senador Elmano Férrer (Podemos-PI) apresentou quatro projetos de lei tratando desses itens. Entre eles está o PL 6.398/2019, que permite a presos participar de audiências por videoconferência, reduzindo assim os gastos gastos públicos com seu transporte, e o PL 6.399/2019, que institui o plea bargain, acordo em que o acusado confessa a infração penal visando encerrar o processo ou reduzir sua pena.
Um dos pontos polêmicos do pacote foi a criação do juiz de garantias — esse item foi adicionado durante a tramitação na Câmara. O ministro da Justiça defendeu o veto a esse item, que também foi criticado por vários senadores.
Armas em propriedades rurais
De autoria do senador Marcos Rogério (DEM-RO), o Projeto de Lei 3.715/2019, que permite ao proprietário ou ao gerente de fazenda andar armado em toda a área da propriedade, e não apenas na sede, ganhou força em meio às discussões sobre a flexibilização das regras de posse e porte de armas. Foram apenas três meses de tramitação entre a apresentação do texto, em junho, e a sanção pelo presidente Jair Bolsonaro, em setembro.
O texto, que define toda a extensão do imóvel rural como residência ou domicílio, alterou o Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826, de 2016), que autorizava a posse de arma de fogo no interior das residências e no local de trabalho, mas não tratava especificamente da situação dos imóveis rurais. Segundo Marcos Rogério, “não tem sentido deferir a posse ao morador da zona rural, mas não permitir que ele exerça seu legítimo direito de defesa fora da sede da fazenda”.
Posse e porte de armas
Embalado pela vitória nas urnas em 2018, Jair Bolsonaro propôs em janeiro, com menos de um mês no cargo, a flexibilização da posse e do porte de armas por meio de decreto — tema que se converteu em um dos focos de atenção do Senado no primeiro semestre. Parlamentares do PT, da Rede e do Cidadania apresentaram projetos de decreto legislativo para derrubar essa flexibilização, alegando inconstitucionalidade da norma. Segundo o entendimento desse grupo, o Estatuto do Desarmamento só pode ser alterado por meio de lei.
“O instrumento utilizado é uma maneira rasteira de driblar o Estatuto do Desarmamento. O Congresso é o local adequado para se realizar qualquer alteração no que diz respeito a porte e posse de armas, uma vez que está havendo criação de direitos”, disse Fabiano Contarato (Rede-ES) ao defender a derrubada do decreto.
Após rejeitar o decreto das armas do governo, o Senado passou a trabalhar em um projeto de revisão do Estatuto do Desarmamento que aumenta a potência de arma autorizada para civis e exige a realização de exame toxicológico para aquisição de arma de fogo. Batizado de PL das Armas, o Projeto de Lei 3.713/2019 está em análise na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), mas perdeu espaço com as discussões sobre a Reforma da Previdência. Apesar disso, a expectativa do relator do projeto, senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), é que o tema avance no próximo ano.
— Teremos a pauta ainda voltada com mais ênfase para reformas estruturais, como é o caso da [Reforma] Tributária. De toda forma, já temos o trabalho avançado, que pode ser retomado a qualquer tempo — declarou Alessandro à Agência Senado.
O texto atual é um substitutivo a uma proposta apresentada por senadores do PSL e pelo líder do governo, senador Fernando Bezerra (MDB-PE). O substitutivo praticamente repete o teor dos decretos editados por Jair Bolsonaro. Bezerra, Major Olímpio (PSL-SP), Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) e Soraya Thronicke (PSL-MS) argumentam que a maioria da população escolheu, ao votar em Bolsonaro nas últimas eleições, o direito à posse e ao porte de armas de fogo e à garantia da legítima defesa do cidadão.
Já o senador Styvenson Valentim (Podemos-RN), policial militar por mais de 15 anos, defende propostas que exigem exame toxicológico para quem adquire armas de fogo, tanto policiais como civis. Ele não se opõe ao acesso a armas pelos cidadãos, mas defende critérios mais rígidos para essa autorização.
Segurança privada
Outro assunto que não se esgotou em 2019 é a criação do Estatuto da Segurança Privada e da Segurança das Instituições Financeiras (SCD 6/2016). Além de piso salarial para os vigilantes, o texto prevê a regularização da atividade de profissionais que hoje atuam de forma irregular, sem fiscalização da Polícia Federal, principalmente em vigilância eletrônica.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou relatório favorável à proposta, com alguns ajustes. O texto aguarda votação na Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC).
Medidas de proteção às mulheres
Preocupação recorrente no Senado, a violência contra as mulheres foi tema de vários projetos aprovados ao longo do ano, entre eles a proposta de emenda à Constituição (PEC) 75/2019, que torna o crime de feminicídio imprescritível e inafiançável. A PEC, que seguiu para a Câmara dos Deputados, determina que o homicídio motivado por violência doméstica ou discriminação à condição feminina poderá ser julgado a qualquer tempo, independentemente da data em que tenha sido cometido. Atualmente, esse tipo de crime prescreve após 20 anos.
— Estamos lutando por essa PEC. Não é a luta de um dia, mas a luta de um país. É o clamor das mulheres do país que está nas mãos dos senhores — disse a autora, senadora Rose de Freitas (Podemos-ES), que agora está licenciada.
Agentes penitenciários
Os agentes penitenciários passaram à categoria de policiais penais com a promulgação da Emenda Constitucional 104, de 2016. A nova norma cria as polícias penais federal, dos estados e do Distrito Federal. A classe fica vinculada ao órgão administrador do sistema penal da unidade federativa a que pertencer.
Para o senador Major Olimpio (PSL-SP), “não havia o menor cabimento em dar a obrigação policial sem dar o suporte constitucional, o reconhecimento e as garantias inerentes à atividade”. Para ele, essa norma pode ser considerada a “maior conquista da história do sistema prisional brasileiro”.
MP sobre bens do tráfico
Visando facilitar e agilizar a venda de bens apreendidos ou sequestrados vinculados ao tráfico ilícito de drogas, o Senado acatou a Medida Provisória 885/2019. O texto, aprovado sob a forma do Projeto de Lei de Conversão 20/2018, foi sancionado na forma da Lei 13.886/2019. A expectativa é que a medida beneficie, por meio de repasses, os estados e o Distrito Federal.
Fonte: Agência Senado