ARTIGO: ACÍLIO LARA RESENDE
Será cada vez mais difícil a vida de quem não habita os extremos
Ouço notícias com frequência, em roda de amigos e na minha família, sobre mudanças, para outras plagas, de mineiros decepcionados com nosso país. E sempre palpito: antes de tomarem tal decisão, deveriam, em primeiro lugar, substituir a letra ”d”, do verbo “desistir”, pela letra “r”, do verbo “resistir”. Resistindo aqui, e escolhendo os melhores para nos governar a partir de 2019, ajudariam a reconquistar a palavra confiança e, mais que tudo, leitor, a consolidar nosso incipiente regime democrático. Sem ela e sem ele nos sobrará um país em ruínas.
Esse fenômeno acontece no país inteiro. São muitos os brasileiros que alegam medo do que possa acontecer após as eleições deste ano. Esse medo advém, sobretudo, do rumo que a política, polarizada entre duas correntes radicais, tem tomado entre nós.
Semana passada, em sua crônica semanal no jornal “O Globo”, Verissimo, certamente cansado com o que de desastroso se passa em nosso país, disse que “Shakespeare descobriu um jeito de escrever sobre política sem se envolver em política. O jeito: escrever sobre política no passado, numa Inglaterra remota no tempo, ou em outras terras, algumas até inventadas por ele. Não lhe faltaria assunto se escrevesse sobre a Inglaterra do seu tempo, um século de intrigas e conspirações, com personagens suficientes para encher vários fólios”.
Depois de ler Verissimo, carente e saudoso, lembrei-me de reconhecidos intelectuais mineiros que foram também grandes homens públicos. Edgard Godoy da Mata Machado é um deles. Mineiro de Diamantina, professor, escritor, filósofo, jurista e jornalista, Edgard trabalhou, em Beagá, na “Folha de Minas”, no “Estado de Minas” e no “O Diário”. No Rio de Janeiro, nos jornais “O Globo” e “Diário de Notícias”.
Nasceu no dia 15 de maio de 1913 e morreu em dezembro de 1995, aos 82 anos, em Belo Horizonte. Foi signatário do “Manifesto dos Mineiros” e chefe de Gabinete do ex-governador Milton Campos e, depois, deputado estadual e federal. Em 1990, como suplente do senador Itamar Franco, chegou, enfim, ao Senado, engrandecendo-o. Filiou-se à UDN, ao MDB e ao PMDB. Em dezembro de 1968, em razão da sua oposição ao regime, foi cassado com base no AI-5. Em seguida, foi afastado da cátedra, para a qual só retornou após a anistia, em 1979. Ficou literalmente impedido de exercer sua profissão. Em 1973, seu filho José Carlos Novaes da Mata Machado, estudante de direito, foi preso e assassinado pela ditadura. Sobre o sofrimento, nos deixou esta dolorosa e profunda lição: “Sofrer passa. O que não passa nunca é ter sofrido”.
Pergunto-lhe, leitor: se Edgard ainda estivesse entre nós, como se comportaria diante desse quadro político tenebroso, que espalha violência e ódio entre os brasileiros? Que diria da polarização entre duas candidaturas, que, na verdade, pertencem a duas facções?
Edgard, certamente, concordaria com Fernando Gabeira, que disse em sua última crônica que, “se continuarmos assim, abrigados em tribos, acreditando apenas no que queremos acreditar, será cada vez mais difícil a vida de quem não habita os extremos”.
Aproximamo-nos de eleições imprevisíveis e decisivas para o futuro do país. Como não habito os extremos, prevejo tempos nebulosos. A quem, finalmente, interessa essa polarização irracional?
Com certeza, não é ao Brasil, que é muito maior e mais diversificado do que imaginam os insaciáveis radicais de plantão!